Viajar pelo mundo em missões técnicas ligadas ao agronegócio me trouxe uma visão privilegiada sobre como diferentes países lidam com o desafio de produzir alimentos e, ao mesmo tempo, preservar o meio ambiente.
Em todas essas experiências, uma constatação é inevitável: nenhum país preserva tanto quanto o Brasil para dentro da própria porteira.
Enquanto em lugares como Estados Unidos e Europa a preservação está muito mais associada a incentivos financeiros ou a áreas públicas destinadas à conservação, aqui o agricultor é obrigado a manter de 20% a 80% de sua propriedade intacta, dependendo da região.
Isso significa que o produtor brasileiro produz em menos área do que poderia e ainda assim sustenta a posição de líder global em diversas cadeias agrícolas.
Apesar disso, o Brasil segue sendo alvo de críticas externas, e muitas vezes internas, feitas por quem não conhece nossa legislação ou prefere ignorá-la.
Há uma contradição evidente: somos um dos países que mais preservam, mas um dos que mais sofrem com desconfiança.
No fim de agosto, o Congresso Nacional aprovou a prorrogação, até 2030, do prazo para que produtores rurais em áreas de fronteira regularizem seus imóveis.
A medida, defendida por entidades como a Aprosoja Mato Grosso, pode parecer apenas um detalhe burocrático, mas, na prática, é questão de sobrevivência para milhares de agricultores que enfrentam processos lentos em cartórios e a insegurança jurídica típica do Brasil.
O produtor rural brasileiro convive com um excesso de exigências legais e uma morosidade que não combinam com a urgência da produção de alimentos.
Regularizar uma propriedade, em muitos casos, significa entrar em uma maratona de prazos, protocolos e recursos.
A prorrogação dá fôlego, mas evidencia uma ferida mais profunda: a dificuldade histórica do país em dar previsibilidade ao direito de propriedade.
Se de um lado temos agricultores que preservam mais do que seus pares no mundo, de outro temos um Estado que muitas vezes não consegue oferecer a agilidade necessária para transformar segurança jurídica em competitividade.
É essa equação que precisa ser revista com urgência, sob pena de continuar limitando nosso potencial de crescimento sustentável.
O Brasil já provou que pode ser exemplo de preservação.
Agora precisa provar que pode ser também um exemplo de previsibilidade.
*Por Fábio Torquato, Economista, formado em Relações Internacionais, fundador da Agrotravel