Empresas rurais quebram por falta de sucessão, não por falta de safra, alerta especialista

A sucessão no agronegócio é uma bomba-relógio que explode em silêncio.

Mesmo entre grupos familiares consolidados, a ausência de planejamento jurídico e sucessório tem levado à perda de patrimônio e à paralisação de negócios produtivos.

O advogado Adhemar Michelin Filho, especialista em Direito do Agronegócio e sócio da Michelin Sociedade de Advogados, alerta que a transição de comando no campo é uma das mais complexas do país e uma das menos debatidas.

“Muitas empresas rurais quebram não por falta de safra, mas por falta de sucessão. O problema está menos no clima e mais no jurídico: falta estrutura, planejamento e diálogo entre gerações”, afirma.

Michelin Filho explica que o principal entrave é o ITCMD, imposto estadual sobre heranças e doações, que pode forçar famílias a vender parte da propriedade para quitar a dívida tributária.

“O imposto, que deveria garantir justiça fiscal, na prática destrói negócios produtivos. A baixa liquidez dos bens rurais obriga a venda de terras para pagar o ITCMD, e a avaliação feita com base no valor de mercado, e não no declarado no ITR, eleva ainda mais a cobrança”, observa.

Ele lembra que a falta de liquidez e a tributação em cascata têm levado muitas famílias à descapitalização completa.

“É comum ver fazendas sendo vendidas às pressas, desmembradas ou arrendadas apenas para quitar imposto. E isso poderia ser evitado com um planejamento sucessório estruturado.”

Outro ponto sensível é a mistura entre bens pessoais e empresariais.

Segundo Adhemar, essa prática, ainda comum no campo, cria um passivo oculto que pode comprometer o negócio inteiro.

“Grande parte dos produtores rurais opera com confusão patrimonial sem perceber. Essa informalidade é um risco jurídico e fiscal: dificulta a comprovação de receitas e despesas, expõe o patrimônio pessoal a dívidas da fazenda e abre margem para autuações e perda de incentivos fiscais”, explica.

A saída, afirma o advogado, é profissionalizar a estrutura por meio de holdings rurais.

“A holding separa o patrimônio pessoal do empresarial, define regras de gestão e evita que a sucessão se transforme num inventário judicial demorado e litigioso. A transferência de bens passa a ocorrer por quotas da empresa, e não por partilha física da fazenda.”

Para Adhemar Michelin Filho, o maior obstáculo ainda é emocional.

“No campo, ainda é tabu falar sobre morte e sucessão. Essa resistência é o que mais destrói legados familiares, não a lei, nem o fisco. Sem diálogo, o que era para ser uma transição planejada se transforma em disputa judicial”, destaca.

A consequência é grave: inventários litigiosos que paralisam a gestão da fazenda, geram altos custos jurídicos e, em muitos casos, terminam na venda forçada da propriedade.

“Sem consenso, não há planejamento em vida. E sem planejamento, o ITCMD incide sobre o valor integral do patrimônio, ampliando a carga tributária e minando o negócio.”

“A sucessão não é apenas a transferência de bens, mas de conhecimento, valores e gestão. No agronegócio, planejar é proteger o patrimônio e o legado familiar”, resume o advogado.

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