Comissão Técnica da FAESP estima prejuízo de R$ 2 bilhões com incêndios

A federação e outras entidades, como a Orplana, defendem ações integradas de prevenção e proteção aos direitos dos produtores rurais

A Comissão Técnica da Cana-de-Açúcar e Energia da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (FAESP) aponta uma previsão inicial de mais de R$ 2 bilhões de prejuízos no campo devido aos incêndios ocorridos recentemente.

As projeções são de que o fogo afete não apenas a safra deste ano, mas também a de 2025/2026.

Os técnicos que formam a comissão abordaram, em reunião realizada na semana passada, a necessidade da revisão e regulamentação de algumas leis que tratam do assunto, como o Decreto Federal nº 12.189, sancionado no dia 20 de setembro.

A FAESP e outras entidades do setor agropecuário, como a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) e a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), pedem a revisão ou suspensão do decreto, que responsabiliza sumariamente proprietários rurais por incêndios em suas terras, sem garantir direito ao contraditório e à ampla defesa.

Nelson Perez Junior, coordenador da comissão, afirma que o ideal é criar um grupo de trabalho que reúna entidades como a Defesa Civil e a Cetesb – Companhia Ambiental do Estado de São Paulo – para discutir métodos de proteção não apenas das áreas produtivas, mas também das florestas de áreas de proteção permanentes (APPs) e das reservas legais, essenciais para a qualidade do campo.

Questões como nexo causal e a queima prescrita, assim como ações de limpeza das margens de rodovias e ferrovias, devem fazer parte da pauta.

“O setor produtivo ainda está contabilizando os prejuízos. Produtores que dependem do campo para seu sustento estão muito preocupados com o futuro. A integração de todos os envolvidos na prevenção e combate é essencial para que não tenhamos, no próximo ano, mais perdas econômicas, ambientais e de vidas”, explicou o coordenador.

O presidente da FAESP, Tirso Meirelles, lembrou que existem ações que já estão à disposição de prefeituras e sindicatos rurais, como o curso do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) sobre Prevenção e Combate a Incêndios no Campo. Há ainda a discussão sobre o pedido de uma linha de financiamento, sem taxa de juros, para a compra de equipamentos leves e maquinário que possam ajudar no trabalho de brigadas de incêndios e equipes de Defesa Civil municipal no combate a princípios de incêndios.

“Os produtores rurais são as grandes vítimas dos incêndios e não podem sofrer com a repetição desse cenário. Além de perderem sua renda e empreenderem recursos próprios para controle dos focos de incêndio em suas propriedades, têm sido injustificadamente penalizados”, explicou Meirelles, destacando que a FAESP mantém contato com a Defesa Civil e o Ministério Público, entre outros órgãos, para prevenir novos incêndios.

“Temos de buscar a integração dos órgãos públicos, entidades, sindicatos, cooperativas e todos os produtores para a construção de um campo mais seguro. O sistema FAESP/Senar-SP estará sempre trabalhando por essa união de esforços”, concluiu.

Desafios aos produtores

Para discutir os impactos dos incêndios aos produtores, a Associação Brasileira do Agronegócio e a sua regional em Ribeirão Preto (Abag-RP) realizaram um webinar, com participação do CEO da Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil (Orplana), José Guilherme Nogueira. O evento foi no último dia 4 de outubro.

Durante o encontro on-line, cujo tema foi “Incêndios florestais: prevenção, combate e impactos no agronegócio”, Nogueira representou as associações de produtores de cana destacando os prejuízos que têm enfrentado devido aos incêndios, afirmando que “a temperatura acima da média e a falta de chuvas impactaram diretamente diversas variáveis meteorológicas”.

Ele lembrou que o início dos incêndios, em 23 de agosto, ocorreu em condições climáticas críticas, caracterizadas pelo chamado “triplo 30” — uma combinação de temperatura máxima, umidade do ar e vento de rajada.

O CEO apresentou dados alarmantes sobre a situação nos estados em que atua (SP, MG, GO, MS e MT), com destaque para o Estado de São Paulo, onde, até 20 de setembro, os focos de incêndios afetaram aproximadamente 263 mil hectares de cana, resultando em prejuízos estimados, segundo ele, em R$ 1,59 bilhão. A Orplana representa 35 associações de fornecedores de cana e mais de 12 mil produtores.

“O fogo é inimigo da cana. No passado, ajudou na colheita, mas hoje não. A prática era comum na década de 80, passou a diminuir em torno de 2004 com a mecanização e foi proibida em 2017”.

O webinar também contou com a participação de Carolina Matos, especialista ambiental da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI), que falou sobre os impactos às propriedades rurais e ações de prevenção; do Major Jean Gomes, do Corpo de Bombeiros, que discutiu fogo prescrito e incêndios criminosos; e de Flávio Okamoto, promotor de Justiça do Ministério Público, que falou sobre medidas preventivas e emergenciais.

Houve, ainda, um espaço para discussão sobre a gravidade dos incêndios e a importância da união entre os setores público e privado para enfrentar este desafio. Para a jornalista especializada em agro do Climatempo e mediadora do webinar, Ângela Ruiz, o objetivo foi mostrar a preocupação comunitária em torno das ocorrências de incêndios que têm afetado regiões de mata e áreas de cultivo agrícola no interior de São Paulo e também em outros estados.

A iniciativa foi apoiada pelo Climatempo e pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.

Reação 

Neste cenário marcado por incêndios no campo, deputados federais se uniram à Orplana para expressar preocupações sobre o Decreto Federal nº 12.189/2024. Eles lembram a importância de garantir que as sanções sejam aplicadas exclusivamente aos verdadeiros responsáveis, destacando que os produtores rurais, frequentemente vítimas desse cenário, não devem ser penalizados injustamente.

A deputada federal Marussa Boldrin (MDB-GO) critica o decreto e chama a atenção para a urgência em respeitar o direito à ampla defesa e ao contraditório. “Penalizar o produtor rural, que já sofre com um cenário adverso e, muitas vezes, é vítima dos incêndios, é um ato de injustiça. O produtor brasileiro é referência em tecnologia e compromisso com o meio ambiente, e medidas desproporcionais não são a solução”.

Para o deputado federal Zé Vitor (PL-MG), o decreto inverte o ônus da culpa, obrigando os proprietários a provar sua inocência diante de um problema ambiental complexo.

“Os proprietários já enfrentam os prejuízos dos incêndios e não devem ser responsabilizados como vilões em uma situação que é resultado de crimes ambientais”, diz o deputado, autor do Projeto de Decreto Legislativo nº 352/2024, que tem como objetivo sustar os efeitos do Decreto n° 12.189.

Diálogo e cooperação em SP

Contrapondo-se à abordagem federal, o CEO da Orplana, José Guilherme Nogueira, menciona a diferença nas ações do governo de São Paulo, que tem promovido diálogo e cooperação com entidades do setor.

“O Estado de São Paulo tem buscado soluções conjuntas, disponibilizando linhas de financiamento e recursos para apoiar os produtores, em vez de simplesmente apontar o dedo e culpá-los. Precisamos trabalhar juntos para enfrentar essa nova realidade climática”, afirma. “É fundamental que as sanções sejam direcionadas apenas aos verdadeiros responsáveis pelos incêndios, pois o produtor, cuja propriedade é afetada, também é uma vítima”.

Para os deputados e a Orplana, a produção agrícola e a proteção ambiental podem coexistir, desde que haja justiça na aplicação das medidas, garantindo a continuidade de milhares de produtores que sustentam a economia nacional.

“Chega de abusos! Estamos aqui para defender o agro, ao lado da Orplana e de todo o setor. O produtor não deve ser visto como vilão em um problema que envolve toda a sociedade”, conclui a deputada Marussa Boldrin.

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